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segunda-feira, 1 de abril de 2013

E a torcida grita "FELICIAANO VIAADO / FELICIAANO VIAADO"


O texto a seguir foi originalmente escrito entre 10 e 12 de março, no auge da polêmica. Ele ficou “engavetado” no meu e-mail e permaneceria assim, pois comecei a questionar a necessidade de publicá-lo (ainda questiono, mas darei o enter em seguida).
Mas um Saia Justa obrigou-me a mudar de idéia. O programa da GNT é uma das coisas que mais me irrita (na TV ou não), motivo pelo qual o abandonei desde quando assistira à Márcia Tiburi “derrubar” a astrologia com argumentos esperados de um rapaz da oitava série, isso lá em 2005. 
O poder pseudo-inteligente irritante do programa é tanto que subvertia a filósofa, que faz uns desenhos bem legais e escreve uns artigos idem na Cult, em um contraponto cético-óbvio no debate com o clichê de gostosa sem papas na língua, quase um escada para a espontaneidade da Luana Piovani. Claro, não deveria me irritar, porque eu não deveria assistir, e por isso mesmo eu não assistia; mas ontem a TV esteve na GNT na hora do programa, e inda que tenha abandonado a sessão já no segundo minuto, não pude deixar de ouvi-las comentando a polêmica do pastor Feliciano – aliás, quando escrevia este parte do texto a Astrid Fontenelle questionava se MMA era esporte ou entretenimento É PIOR USO DA LINGUAGEM, A PERDA DE TEMPO COM A FERRAMENTA, EVIDENTEMENTE QUALQUER ESPORTE NA TV É ENTRETENIMENTO PARA QUEM ASSISTE. 
Claro que depois do xingamento todo, eu me reconforto num calmante "deixa assim, não é para mim", mas decidi desengavetar o texto por notar que parte considerável da população opinante tem realmente (como constatei semanas atrás ao escrever) se tornado o inimigo para derrubar o inimigo: 



Eu também não gostei do pastor Marco Feliciano presidir justamente a Comissão de Direitos Humanos. Aliás, beirei a revolta, porque tudo beirou o ridículo. Mas é preciso um pouco de calma: primeiro, não é porque ele é pastor que não possa fazê-lo – isso seria preconceito; não pode fazê-lo porque seu portfólio de declarações o descredita. Mas ele chegou à Comissão, à desprezada Comissão que não davam bola, e chegou democraticamente. Devemos combater, mas é preciso cuidado com a falta de critérios baseados na máxima “guerra é guerra”: não devemos nos rebaixar ao mesmo nível e usar o jogo de simplificação utilizadas por Marco Feliciano em sua exegese bíblica relativamente às coisas que ele diz e disse: o que se tem associado ao pastor é que ele é homofóbico e racista; num nível mais detalhado, dizem que ele deu declarações homofóbicas e declarações racistas, esta última especialmente à sua interpretação da maldição de Cam, o filho de Noé, realmente narrada pela Bíblia Sagrada; num nível mais detalhado ainda, já se torna estranho chamá-lo assim baseado em bobagens que disse no twitter ao sabermos que seu padrasto é negro e sua mãe mestiça (não sei se este termo é adequado, ainda que eu mesmo me considere orgulhosamente mestiço), o que tem mesmo status de negro nos movimentos de minoria – o próprio pastor não é nem de longe um caucasiano nazista visualmente falando. 

Pois bem, lembro que ser contra a união homossexual na igreja cristã (sem prejudicar a mesma união civil) não é homofobia, é uma posição religiosa – é como se houvesse uma revolta de judeus para poderem comer carne de porco. Cabe lembrar que a Igreja Católica, por exemplo, também não permite casamentos entre divorciados, e que, para eles, conceber filhos é o objetivo primordial do casamento – o sexo anal seria proibido entre heterossexuais também, tal como o preservativo, o uso de pílula ou quaisquer contraceptivos, além do sexo casual. E não há passeatas para que a igreja aceite o sexo casual, porque se está acima disso, ninguém precisa do aval da igreja para saber que isso não é uma coisa hedionda, a não ser por um moralismo antiquado e recalcado que já deveria ter sucumbido por completo aos avanços finais do milênio passado – grandes coisas o que a igreja pensa. Embora inda lentamente, o Estado tem se aproximado cada vez mais do seu bem-vindo estado laico.  

No seu discurso oficial, o pastor fala em relativizar o foco da defesa dos direitos LGTB, em “um protecionismo exacerbado com o movimento LGBT”, no sentido de não se tornar uma comissão de minorias, mas uma comissão dos sofrimentos das minorias (que tenham direitos, mas não privilégios). Fala em especificar o que é discriminação na PLC 122, para não blindar um grupo da sociedade em vez de protege-lo devidamente, que é o necessário. Além disso, ele defende que os homossexuais são menos desprotegidos do que (nas palavras dele) "os matutos, os mendigos, as meninas que sofrem abuso no nordeste", na medida em que ocupam posições sociais e financeiras acima da média. Sem entrar no mérito de quão questionável isso seja, revela-se aí o oportunismo politicamente correto de origem superficial em muito dos protestos desproporcionais ocorrentes (chegou-se ao cúmulo de cometer homofobia para combater homofobia, ou seja, uma série de piadas sugerindo que o pastor fosse um gay enrustido).  

No mínimo é válido o debate, porque sabe-se que nenhuma posição pode ser unânime sem antes ser discutida. Ou, mais no mínimo ainda, por mais absurdo que pareça dizer isso no momento, ele deve ser primeiro ouvido antes de atacado (não se deve combater a violência com mais violência, porque às vezes as violências não são tão identificáveis para dizer quem começou). 

As suas práticas na igreja (pedir senha do fiel etc.) usadas contra ele beiram um certo sensacionalismo, uma outra face da mesma moeda do moralismo tão condenável. Renan Calheiros mandou um abraço, aliás. 

(A Assembléia de Deus e suas primas se parecem muito com o tráfico de drogas: prestam um serviço a seus usuários – que têm o direito de usarem/acreditarem no que quiserem –, mas é criticável porque não pagam impostos relativos aos imensos (ou parte dos imensos) valores que movimentam. Uma não paga porque é contra a Lei, a outra não paga protegida pela Lei. Ambos (tráfico e igreja) enchem os bolsos de uns a custas do benefício causado a muitos e abuso de uma minoria manipulável ou fraca demais para não se tornar incontrolavelmente vítima de sua própria inocência.) 

Eu continuo a favor de toda forma de amor, que cada um tem direito de fazer o que quiser desde que não invada o espaço alheio, crente de que somos efetivamente irmãos (eu já não gosto do hino do Rio Grande do Sul pelo seu tom bairrista), além das fronteiras, continuo acreditando que não há pureza em qualquer configuração genética humana (passaram negros e alemães em todas as árvores genealógicas), bem como me conscientizo de que as minorias tiveram anos de tratamento desigual oficial, o que deve então ser também de maneira oficial compensado, tudo isso para mim é até óbvio – e o é desde que eu era aluno do primeiro grau, pois para mim sempre foi evidente o fato de qualquer um ter direito pleno de ser o que se é, e, embora juro não seja de fazer isso, encho a boca para dizer que nunca, nem no maternal, tratei alguém diferentemente por preconceito. Mas, ainda que talvez o modus operandi seja secundário no momento, ainda que os meios sejam coadjuvantes dos fins no momento, sou também contra a este apelo de chamar o pastor homofóbico e racista baseado apenas no que se basearam, e para derrubá-lo. Não é sem reflexão crítica que teremos razão, não é com simplificação sensacionalista, à base do a qualquer preço, que se busca o correto. É preciso, antes de tudo, dar o exemplo, seguir o princípio. O bem e o mal bem definidos é condição feérica, convém sempre como exercício relativizá-los na vida real. 

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