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terça-feira, 12 de agosto de 2008

u de utopia



O logo logo no início do filme já diz a que o filme veio. É a marca do Batman, está no céu, mas não é tal e qual como conhecemos: este logo do cinema está para o logo do quadrinho assim como o logo do quadrinho está para a imagem de um morcego em si. É uma referência, uma citação, uma inspiração, um conceito, mas é outra coisa, uma coisa nova que, por dentre as nuvens, quase imperceptível, abre o filme sombriamente.

Não é como a esfera amarela que encima a página 40 do primeiro álbum da minissérie Cavaleiro das Trevas, porque estamos numa sala de cinema e o que vemos é cinema. E Batman mesmo é quadrinho, é capa azul, cinto amarelo, uniforme cinza. O Batman fica negro por causa das sombras, não carrega o negro no uniforme.

Sempre é necessariamente uma adaptação toda obra que vira filme – na literatura tanto quanto, por isso é preciso desprender-se do original – a linguagem é outra, e a equivalência da obra não deve estar no conteúdo e sim na maneira como usa da linguagem (por exemplo, eu imagino que o filme La Mala Educación, do Almodóvar, teria alguns recursos parecidos com o livro Budapeste, do Chico Buarque). Porém geralmente o caso dos super-heróis é mais linear: a comparação se dá na narrativa mesmo, no conteúdo, porque o super-herói em si é um conceito narrativo a ser explorado, é uma descrição (argumento) a ser materializada.

Então há sempre uma adaptação mais aguda (em verdade, no caso dos super-heróis, esta adaptação é algo mais superficial do que falava (não num tom pejorativo), como já havia mais ou menos dito ao usar a palavra linear linhas acima) quando se busca realidade. Do contrário, ou temos a coragem visual de Burton ou, claro, ao seu tempo e à sua proporção, o real enquanto realidade de cinema, como no caso do clássico Superman de Donner.

A atuação de Health Leader teve um impacto tão grande por aí que ele até morreu para mitificá-la (agora é um saco ficar ouvindo “o Coringa roubou o filme” – mas a crítica popular deve ser desprezada, caso contrário daria para escrever um livro só para odiá-la). Diverti-me muito, especialmente imaginando a versão brasileira. Mas nada que me levasse a escrever compulsoriamente, como noutros casos.

Bom, este blá-blá todo é porque vi V de Vingança. E não foi no Sistema Brasileiro de Televisão, pois deu anteontem, eu havia assistido uns dias antes.

Chicago, ou melhor, Gotham City, precisa de um herói com face, diz Batman. Mas um herói com face é humano, e portanto não pode ser herói. Um herói sem face é o que temos em V de Vingança. E um herói cuja face pode ser de todos, por não ser a dele.

Sempre falo das metonímias do cinema, como disse aqui, de algum elemento fílmico (que toma de empréstimo tantos outros: palavra, imagem, movimento, som, teatralidade etc, e, às vezes, a convergência destes) que resuma o filme todo.

E temos a cena acima. Resume não só o filme todo como a própria idéia de revolução: Evey beija (uma concretização), mas beija a máscara.

A revolução é um cheiro que nos faz comer algo que não tem semelhante gosto.

Ela fala no homem e na idéia, e ela beija a idéia, pois não pode beijar o homem, que em verdade ela nem conhece, que em verdade não importa. Ela beija a máscara a qual cabe a qualquer um (a idéia) e isso é explicado verbalmente já no início da fita e novamente no fim, sem que fosse preciso (as pessoas (todas, até as já mortas) retirando suas máscaras no final. Assisti sem ter lido o gibi e neste filme também não escreverei criticamente – como o fiz no lugar que foi linkado antes – porque o que li a respeito já me foi suficiente, não tenho a acrescentar. Mas do recorte dele (independente das diversas camadas das quais se originou), esta bela cena resume a utopia da revolução: V era uma paixão intangível para Evey, mas a paixão dela a fez se mover.

E no fim de tudo Batman é bat, simplesmente.

3 comentários:

  1. me recuso a comentar com alguma propriedade. não só me recuso, como não consigo. acho que nem a página suportaria mais propriedade.

    que bom que assinei seus feeds.

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  2. No beijo é possível ir além da máscara? Em algum beijo é possível superar a idéia e encontrar o homem?

    Se uns buscam a desumanização como forma de representar o coletivo, eu quero é exatamente o contrário -- que o peculiar seja tão agudo que possa irromper dentro da multidão até iluminar meus olhos.

    E, assim, que eu reconheça uma dissonância no mar da igualdade.

    (( viajei... ))

    Beijo

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  3. É, efetivamente o beijo pára sempre na "máscara". Mas quando a máscara é uma máscara plástica ou equivalente, sente-se somente o próprio gosto. Agora se é uma boca mesmo, ao menos há um gosto para ser associado à idéia. E isso sempre é o mais interessante, cada um é diferente.
    Viajar é fundamental.
    Alan, foi dito algo, e isso já tem propriedade - s/ querer ser clichê.

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