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quinta-feira, 14 de junho de 2012

1990/91


“Publiquei” em 1991, na 2ª série, então com 8 anos (alfabetizara-me um ano antes), um livro completo, encadernado, sobre animais.
Antes disso, houve vários projetos iniciados, mas aquele foi o primeiro que terminei (e nas páginas finais nota-se já minha insistência forçada para tê-lo atingido, denunciada na desconcentração, e esta denunciada na aplicação bem mais diluída do lápis de cor e textos cada vez menores – tanto que por hábito guardava a página do tigre sempre para 78 ou 87, e não consegui chegar até lá, deixando o Panthera tigris na 68 mesmo).


Na ocasião, a minha professora Núbia (e a diretora, e o pessoal da livraria Pappus que encadernou) ficou orgulhosíssima, e divulgou para toda turma 21, aumentando a fama de CDF que carregava à época (fama que no ano seguinte se subverteria descambando para a ala frequentadora da coordenação e SOE para todo o restante da vida escolar, sem entanto (e modéstia à parte) prejudicar as notas); na divulgação, ela escolheu aleatoriamente um capítulo, que era o do Alossauro, vermelho, com um vulcão ao fundo (inspirado num livrinho colecionável da Elma Chips), com uns trezentos dentes,  e curiosamente, era o artigo que mais continha erros de português. Os demais animais não eram extintos, muito menos há milhões de anos. Eram lobos, gnus, cães etc. Todos exibiam invariavelmente seu órgão sexual (talvez estivesse relacionada com os descobertas que fazia de mim mesmo e das meninas (porque as tetas também apareciam), mas pelo que lembro (e me lembro bem) era mais uma tentativa de fidelidade e classificação científica do que uma expressão espontânea). Em breve digitalizá-lo-ei tal qual o fiz com o que apresento a seguir.


Antes, no verão do mesmo ano, entre dezembro de 90 e janeiro de 91, compramos um caderno no Mercado da Dª Nair (se me não engano), na gloriosa e sempre saudosa Albatroz (um balneário, mas que leva o artigo feminino pois para nós sempre foi e será a ideia libertadora de praia), também porque era o que me acalmava, aliado à brincadeira Pu (uma hora falo mais sobre isso, mas basicamente consistia em um totem de bolso que me permitia criar imaginativamente qualquer coisa, com diálogos, efeitos sonoros, reinvenção de notícias, de jogos de futebol comigo no lugar do protagonista etc., mas que externamente era apenas eu falando e gesticulando sozinho com um pedaço de lego), enfim, era o que acalmava o piá nos locos dias de verano.


A inspiração para este caderno foi um gibi do Fantasma, comprado num artesanato, de qual foram tomadas algumas referências visuais, e uma enciclopédia de animais, da qual alterava deliberadamente os dados (para mim não era suficiente a gama de presas grandes que um tigre já tinha (cervos, javalis, búfalos e até ursos e filhotes de rinocerontes) , ele tinha que caçar também hipopótamos (o que, sabemos, é geograficamente impossível)).
Há alguns motores e caminhões no meio dos animais, frutos de umas revistas da época que o vizinho da frente (o Dodo) emprestou (aliás, pararei por ora de listar os detalhes, se não acabarei por descrever o verão inteiro).


 

Lançamento de coelho: hábito do Puma concolor, segundo minhas pesquisas científicas imaginárias
     


 

Minha liberdade poética se dava, como disse antes, na subversão dos dados, como a observação de que, com uma patada, um Puma (Puma concolor) pode lançar um coelho a 2 quilômetros (!) de distância, ou a velocidade do leopardo (280 km/h), que só é alcançada por a de alguns falconiformes em pleno voo e em pleno mergulho. Gosto especialmente da história em quadrinhos que se inicia na página 16 (pág. 3, da reprodução parcial no fim deste post); nela já exercitava minha análise crítica e já a exercia involuntariamente: o título “A Natureza”, diz, mais do que a intenção ambiental à época, muito sobre a natureza humana, tratando do trágico e clássico tema da vingança. Nesta história meu fôlego também se mostrou de menino, já que não sabia que final dar-lhe, e precisava disso para ir p/ a próxima página (fascinante e terrível exercício de escrever um livro exatamente como se o lê, ou seja, página por página, em ordem, e usando os dois lados da folha), donde que minha prima Analice (hoje mãe de minha afilhada Manuela), tascou-me o lápis da mão e resolveu a parada, ganhando para o meu todo sempre particular esta coautoria.
Destaco os nomes Maik, Joe e Biler, além de alguns trechos em que a leitura dos balões é invertida, ao estilo mangá.
A minha parte favorita é aqui, na página 26: embora pareça a marca do desenho no verso, lembro-me bem que este traço suave, ao fundo, da mãe do tigre morta é um recurso de linguagem muito comum no cinema: a imagem de uma cena anterior (tal e qual) transposta, sugerindo a lembrança do filhote; tanto que para fazer este flashback, usei o mesmo desenho no quadrinho da tigresa morta que aparece antes, porém com o lápis bem leve, para iludir transparência.
Nisso certamente ele se aproxima do homem morcego, cujo olhar da criança recém tornada abruptamente órfã se fixa no olhar culpado do assassino.


Flashback na apropriação translúcida do quadrino anterior



Enfim, alguns trechos exibidos parcialmente no documento abaixo (disponível para download (acho melhor visualizar direto em PDF, para quem se prestar no link http://issuu.com/joaogrando/docs/1990):


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